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Tudo o que você precisa saber sobre a recuperação judicial da Latam

Leonardo Cassol
26/05/2020 às 16:27

Tudo o que você precisa saber sobre a recuperação judicial da Latam

A Latam surpreendeu o mercado com um pedido de recuperação judicial de suas afiliadas no Chile, Peru, Colômbia, Equador e Estados Unidos. As unidades do Brasil, Argentina e do Paraguai não foram incluídas, pelo menos por enquanto. Mas o que é recuperação judicial? Por que a empresa recorreu a esse instrumento, mesmo tendo dinheiro em caixa? Como ficam as rotas, a operação dos voos e a venda de passagens? Corro o risco de perder meu crédito, voucher ou meus pontos Latam Pass? Quais as chances da Latam falir? Respondemos a essas e outras perguntas de maneira didática e objetiva, com bases nos dados e fatos disponíveis, que você confere nesse post exclusivo.

O que é recuperação judicial?

A recuperação judicial é um instrumento legal que permite às empresas endividadas negociar débitos com seus credores, utilizando a mediação da justiça. O objetivo é evitar que a operação da empresa seja prejudicada, inviabilizando completamente o negócio.

Ao pedir a recuperação judicial, as empresas podem ficar um período sem pagar os credores, que precisam aguardar a apresentação de um plano de reestruturação da dívida. Dessa forma a companhia preserva todos os seus ativos e pode conseguir descontos para quitar os débitos. Em contrapartida, precisa dar informações detalhadas à justiça e aos credores sobre as negociações e o total de dívida.

Nos Estados Unidos, é o Capítulo 11 da Lei de Falências que define as regras da recuperação judicial. Por isso, muitas vezes esse movimento é confundido com a quebra da empresa, quando na verdade serve justamente para evitar isso. Muitos países se inspiraram na legislação norte-americana para definir instrumentos similares. É o caso do Brasil, com a Lei 11.101/05. Mas, de acordo com especialistas, nos Estados Unidos esse mecanismo é bem mais ágil e menos burocrático que aqui.

Por que a Latam pediu recuperação judicial mesmo tendo dinheiro em caixa?

Com a crise da Covid-19, a Latam praticamente deixou de operar e viu que teria dificuldades para honrar seus compromissos financeiros. A recuperação judicial é uma maneira da companhia alongar sua dívida e conseguir melhores condições de pagamento com seus credores. Ou seja, é uma medida preventiva para poupar o dinheiro que a empresa tem em caixa e ganhar tempo para redimensionar o negócio. Além disso, a ação vai permitir a suspensão temporária do pagamento do aluguel de aeronaves, sem o risco de perdê-las, como aconteceu com a Avianca Brasil. Isso porque a lei de recuperação judicial nos Estados Unidos, diferentemente do Brasil, permite incluir aeronaves em leasing na lista de ativos legalmente protegidos.

Além disso, essa medida pode facilitar o apoio governamental para a empresa. Por exemplo: hoje, logo após o anúncio da recuperação judicial, o Ministro da Economia do Chile reconheceu importância da Latam para a conectividade do país em uma entrevista, indicando que o governo deve ajudar a empresa. Foi a primeira manifestação formal do poder público sobre esse tema, desde o início da pandemia. No Brasil, a empresa negocia em paralelo com as suas concorrentes Azul e GOL um empréstimo de R$ 2 bilhões do BNDES. A empresa também informou que mantém discussões com os governos da Colômbia e do Peru.

Vale destacar que todas as empresas aéreas possuem dívida, em maior ou menor quantidade, já que a aviação é um negócio que demanda investimentos muito elevados e de longo prazo em aeronaves e outros ativos. Mas a Latam entra em recuperação judicial numa posição muito mais confortável que a Avianca Holdings (empresa com sede na Colômbia), por exemplo, que tem um endividamento muito mais elevado e já estava sem caixa para pagar fornecedores e credores alguns meses antes da pandemia.

A decisão indica que a Latam aposta num cenário de recuperação lenta, com muitos meses com pouca demanda. Por isso, seu plano de recuperação deve envolver também a devolução de aeronaves, o fechamento de algumas bases menos rentáveis, a adequação de frequências e a redução do quadro de funcionários. Segundo uma reportagem de hoje do Estadão, junto com o pedido de recuperação judicial, a Latam propôs a devolução imediata de 20 aeronaves, podendo acrescentar mais aviões ao longo do processo.

Naturalmente, o mercado reagiu mal à decisão repentina da Latam e suas ações tiveram forte queda na bolsa.

Como ficam as rotas, a operação dos voos e a venda de passagens da Latam?

A empresa destacou que a medida não vai alterar suas operações no curto prazo. Quem tem passagem marcada ou planeja viajar com a empresa não deve ser impactado. Podem ocorrer eventuais cancelamentos operacionais, mas que já estavam ocorrendo por conta de restrições de viagens impostas pelos governos, como aconteceu na Europa, Argentina, Colômbia e, mais recentemente, nos Estados Unidos.

Mas, como destacou no comunicado enviado ao mercado, a Latam vai “redimensionar suas operações para o novo ambiente da demanda”. Isso significa que a empresa acredita que o mercado de aviação terá uma mudança permanente ou de longo prazo e precisa reavaliar suas rotas, bases e frequências para não perder dinheiro.

Em termos práticos, é provável que a Latam reduza a quantidade de destinos atendidos na Europa, nos Estados Unidos, no Brasil e na América Latina, se concentrando nas rotas mais rentáveis. Por exemplo, em vez de operar voos diretos e regulares para Barcelona, Madri, Frankfurt, Lisboa, Londres, Paris, Roma e Milão, a empresa pode manter 4 ou 5 desses 8 destinos e oferecer os outros através das parcerias que possui com a British e a Iberia. Esse mesmo raciocínio se aplicaria a todos os mercados.

Além disso, nos destinos que a empresa possui mais de uma frequência diária, a quantidade de voos pode ser objetivo de ajuste, de acordo com a evolução da demanda. Mas isso não vai acontecer da noite para o dia e não impede que a empresa ofereça opções de reacomodação para quem for eventualmente impactado por uma mudança.

Tenho crédito, passagem comprada ou voucher na Latam. Devo me preocupar?

Não há motivo para desespero. Deixar de honrar créditos, vouchers ou reservas afetaria imediatamente a credibilidade da empresa e seria o caminho para a falência. E essa é a maior preocupação da Latam agora, preservar a sua imagem. O maior risco nesses casos, ao meu ver, é algum destino desejado deixar de ser atendido com voos diretos. Ainda assim, quem for prejudicado poderá reprogramar a viagem ou pedir o reembolso normalmente.

Já as regras de compra e remarcação de passagens aéreas permanecem as mesmas, sem alterações. O prazo para utilização dos créditos e voucher também não foram alterados.

É importante destacar que na recuperação judicial os clientes tem um tratamento diferenciado, porque o principal objetivo é preservar o negócio e fazer ele voltar a ter capacidade de gerar resultado para pagar os credores. Ou seja, se alguém tiver que ficar na mão não será o passageiro.

Tenho pontos no Latam Pass. O que devo fazer?

A baixa demanda deve continuar trazendo boas oportunidades de resgate de passagens aéreas nacionais e internacionais no curto prazo. Olhando num horizonte mais amplo, de 2021 em diante, a Latam deve sair da recuperação judicial uma empresa menor do que entrou, com uma malha aérea razoavelmente inferior à atual. Caso haja uma equação desproporcional entre pontos vendidos e voos ofertados, isso pode levar a um aumento nos preços de resgate das passagens em pontos, ou seja, numa desvalorização dos pontos acumulados. Mas isso só ocorreria num momento em que a demanda estivesse próxima da capacidade ofertada pela empresa.

Mudar drasticamente o regulamento do programa, ou simplesmente implementar um aumento generalizado nos preços de resgate em pontos assustaria os clientes e não faria muito sentido num período em que a demanda está muito baixa, os aviões estão vazios, e que os clientes precisam de incentivos para voltar a viajar. Mas, logicamente, isso não impede que a empresa faça ajustes ou mude algumas regras.

Sair correndo por aí emitindo passagens sem planos concretos de viagem, somente pelo receio do que pode acontecer, não me parece a decisão mais inteligente. Primeiro, porque mesmo que o pior aconteça, ainda vai levar um bom tempo. Segundo, porque a pandemia ainda implica riscos e incertezas para as viagens, num momento em que sequer temos uma perspectiva imediata de reabertura de fronteiras na maior parte dos países, no caso das viagens internacionais, ou do fim da quarentena e reabertura do comércio e das atrações nas principais cidades brasileiras. Mas é importante acompanhar de perto dos desdobramentos dessa crise para agir rápido, se for necessário. Da nossa parte, vamos acompanhar todo o processo de perto aqui no Melhores Destinos.

Se a recuperação judicial é para ajudar a preservar a empresa, por que a Avianca Brasil não conseguiu sobreviver?

Primeiro, porque as empresas entraram no processo de forma completamente distinta. A Avianca Brasil estava sem caixa e tinha um endividamento infinitamente maior, se consideramos a proporção do volume do débito sobre os ativos e a receita gerada. Além disso, quando pediu socorro judicial, a Avianca Brasil já estava com vários meses de atraso nos pagamentos de fornecedores e do leasing de aeronaves. E esse ponto foi crucial. Pela lei brasileira aviões em leasing não são considerados ativos protegidos, sendo, dessa maneira, passíveis de retomada pela empresa lessora em caso de inadimplência. E a perda dos aviões foi determinante para a Avianca perder as poucas chances que ainda tinha de sobreviver.

Já a Latam tem quase toda a sua dívida com multinacionais que seguem a legislação norte-americana. E, ao pedir recuperação judicial lá, consegue preservar boa parte do caixa. Isso explica em parte porque a empresa não entrou com um pedido semelhante aqui no Brasil. Talvez o desgaste não compense o retorno, já que a maior despesa das companhias aéreas no momento atual, praticamente sem estar voando, é com o leasing de aeronaves.

Roberto Alvo, presidente do grupo Latam, destacou que cerca de 95% das dívidas da companhia estão concentradas na holding da Latam, sediada no Chile, e não nas subsidiárias.

Além disso, a Latam, diferentemente da Avianca Brasil, é uma empresa global, com ações em bolsa e uma estrutura de investimento muito robusta e com um grande volume de ativos. É auditada por empresas independentes, de grande porte, dando mais transparência e segurança sobre a situação real do negócio.

Outras companhias aéreas podem entrar em recuperação judicial além da Latam e da Avianca Holdings?

Infelizmente, sim. A crise é muito grave e é provável que outras empresas aéreas recorram a esse instrumento para se proteger. Atualmente há especulações que a American Airlines, a Aeroméxico e outras grandes empresas estejam considerando essa alternativa.

Ontem, por exemplo, o governo da Alemanha aprovou uma ajuda de 9 bilhões de euros (mais de R$ 55 bilhões) para socorrer a Lufthansa. Com isso o grupo alemão poderá respirar aliviado.

Vale lembrar também que grandes companhias aéreas nos Estados Unidos, como a própria American Airlines, a Delta e a United já passaram por processos de recuperação judicial, todos bem sucedidos, e conseguiram se recuperar. É o que esperamos que aconteça com a Latam!

Há risco da Latam falir?

Sim, mas é um risco baixo se comparado ao contexto desafiador do setor de aviação, ou mesmo a outras companhias aéreas. Para a Latam falir, o processo de recuperação judicial teria que dar muito errado, deixando a empresa sem outra alternativa, algo que parece bastante distante no cenário atual. Afinal, tanto o governo brasileiro, quanto o chileno, sinalizaram apoio financeiro para o grupo.

Vale lembrar que a Latam buscou voluntariamente o apoio da recuperação judicial, em caráter preventivo, tendo US$ 1,3 bilhão (cerca de R$ 7,3 bilhões) em caixa. Além disso, destacou no comunicado que conseguiu um financiamento de até US$ 900 milhões (cerca de R$ 5 bilhões) em aportes da Qatar Airways, do grupo Cueto e da família Amaro, acionistas de longa data da empresa, que possuem um profundo entendimento da indústria, do grupo e de seus desafios operacionais. Certamente os acionistas não injetariam mais dinheiro se não acreditassem na recuperação do negócio.

Por fim, na extensão permitida pela lei, o grupo destacou que aceitaria outros acionistas interessados ​​em fornecer financiamento adicional. Há opções para a empresa se sustentar financeiramente por muito tempo.


 

A Latam informou ainda, num comunicado ao mercado, que suas afiliadas continuarão operando voos de passageiros e de carga, sujeitos a restrições de demanda e de viagem. Que os funcionários do grupo continuarão sendo pagos e receberão os benefícios previstos em seus contratos de trabalho. Além disso, destacou que os fornecedores serão pagos em tempo hábil pelos bens e serviços entregues a partir de 26 de maio de 2020 e ao longo desse processo. Por fim, que as agências de viagens e outros parceiros comerciais não sofrerão interrupções em suas interações com o grupo.

Segundo Jerome Cadier, CEO da Latam Brasil, a expectativa da empresa é que o processo de recuperação dure entre 12 a 18 meses. “A crise que nos encontramos agora não é fruto da gestão da companhia, e sim de um fator externo”, destacou o executivo numa live do Portal Panrotas.

A Latam também criou um site dedicado ao processo de reestruturação da empresa, com conteúdo em português, que você pode conferir aqui.

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