Geórgia e Armênia: Uma viagem por monastérios e vinhos entre Europa e Ásia
Geórgia e Armênia: Uma viagem por monastérios e vinhos entre Europa e Ásia
Geórgia e Armênia são duas ex-repúblicas soviéticas localizadas no Cáucaso, uma região tão bonita quanto (ainda) desconhecida no mundo. Geograficamente na Ásia e culturalmente na Europa, ambos os países guardam semelhanças e diferenças sutis entre si. Somente uma viagem com calma por suas belas paisagens, conhecendo a história e explorando a rica culinária local é capaz de dar o devido valor a esses destinos que, pouco a pouco, começam a ganhar espaço nos melhores roteiros turísticos.
Embarque com a gente em um surpreendente passeio pelas capitais Tbilisi (Géorgia) e Yerevan (Armênia), descobrindo lugares únicos e responsáveis por importantes legados para a humanidade, como o cristianismo, o vinho, o System of a Down e a Kim Kardashian! 🙂
Como chegar
Geórgia e Armênia estão mais próximas do que você imagina. A capital georgiana Tbilisi é facilmente acessível via Istambul, em voos de aproximadamente duas horas de duração. Aproveitar passagens baratas para a Turquia e de lá seguir com uma low cost costuma ser a opção mais em conta, com voos a partir de U$100 ida e volta (dependendo do período). Promoções também são cada vez mais comuns saindo de outras capitais europeias e do Oriente Médio, especialmente Doha e Dubai, que possuem voos diretos tanto para Yerevan quanto Tbilisi.
Além disso, Geórgia e Armênia também são bem conectadas internamente por voos, ônibus (5h-6h de duração) e até mesmo um trem antigo da época da União Soviética, o que facilita bastante o transporte entre as duas cidades.
Turistas brasileiros não precisam de visto por até 180 dias na Armênia e inacreditáveis 365 dias na Geórgia!
Geórgia
A história do vinho é imprecisa, já que a bebida foi criada antes mesmo da escrita. Mas estima-se que em algum lugar nas montanhas da Geórgia entre 8000 a.C. e 5000 a.C., um fazendeiro descuidado acabou esquecendo um punhado de uvas amassadas dentro de um recipiente. Com o tempo, as frutas sofreram fermentação, exalando um aroma típico que chamava a atenção de quem passava por perto. Alguém não resistiu e resolveu experimentar – glup! O resultado você pode conferir hoje, na sua taça.
Não à toa, o símbolo do país é a Kartlis Deda (“Mãe dos Georgianos“, no idioma local), visível de todos os lugares da capital Tbilisi. A mensagem é clara: Para os amigos, vinho. Para os inimigos… a espada.
Mas de olho na União Europeia, a Geórgia faz a política da boa vizinhança e mantém boas relações com todo o mundo. Aliás, os valores de terras e propriedades são bem baratos por aqui, fazendo de Tbilisi uma cidade cosmopolita, com bastante investimento estrangeiro e cobaia de experimentos que fazem jus à alcunha de “paraíso dos arquitetos”. Construções futurísticas como o Teatro & Centro de Exposições do Parque Rike e a Ponte da Paz já se tornaram cartões-postais, desafiando os sensos estéticos mais puristas e incentivando novos empreendimentos no mesmo estilo.
Passear pelo Centro Antigo de Tbilisi é uma agradável caminhada que mistura o novo ao tradicional, mostrando que a capital georgiana pode sim ser moderninha sem perder sua identidade. Não deixe de embarcar no teleférico até a estátua, com uma linda vista lá de cima. Perca-se pelas ruelas e labirintos que revelam igrejas ortodoxas, feirinhas, cafés, e é claro, muitas adegas pelo caminho.
Uma curiosidade interessante é que o nome oficial do país na verdade é “Sakartvelo”, como era chamado antigamente na língua local. O nome “Geórgia” é fruto da imaginação dos viajantes que cruzavam a Eurásia no passado e se encantavam com a devoção do povo a São Jorge, até hoje o padroeiro da nação.
E caso você esteja se perguntando, o nome do estado americano da “Geórgia” também é apenas uma coincidência 🙂
Uma viagem por uma ex-república soviética não está completa sem levar algumas lembrancinhas para casa. Melhor ainda quando elas são relíquias históricas a preços bem acessíveis! O mercado de pulgas de Tbilisi é o lugar certo para fazer suas “aquisições culturais”. Por lá é possível encontrar uma infinidade de medalhas, moedas, uniformes, estatuetas, penduricalhos e até mesmo documentos reais do período comunista – está tudo à venda! A visita vale muito a pena, nem que seja para fotografar os objetos que são parte do passado recente do país. Caso queira comprar algo, não esqueça de pechinchar!
Quando a fome apertar, passe no centrinho novamente para explorar a fantástica culinária georgiana. Há restaurantes por toda parte – alguns até temáticos -, oferecendo diversos pratos locais, como o tradicional Khinkali, pasteizinhos cozidos recheados com carne ou queijo.
Mas a gastronomia local reserva muito mais! O grande destaque vai para o Khachapuri em suas mais diversas variações. O prato é uma combinação perfeita de uma massa deliciosamente macia com recheio caprichado de queijo. O Acharuli Khachapuri é uma das versões mais famosas, em forma de gôndola normalmente servido com ovo cru e manteiga. Já a Imeruli Khachapuri consegue unir o melhor dos mundos: pizza e pão de queijo.
A proximidade com a Turquia faz com que a culinária georgiana sofra algumas influências de seu vizinho, especialmente em relação às sobremesas. Docinhos turcos e a famosa bakhlava já fazem parte dos cardápios da Geórgia.
Para ficar ainda melhor, acompanhe suas refeições com o inigualável vinho georgiano. Todo restaurante oferece o vinho da casa, e é possível encontrar bons exemplares até mesmo nos supermercados. Se estiver em busca dos melhores vinhos, vá à adega Wine Gallery, quase escondida em uma rua residencial da cidade. A variedade de bebidas é imensa, com garrafas disponíveis para todos os gostos e bolsos. A degustação é permitida. No andar de baixo, barris armazenam o precioso líquido que pode ser comprado até mesmo como refil, em garrafas plásticas a partir de US$ 2!
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Armênia
Coincidentemente a Armênia também possui uma estátua símbolo para chamar de sua: trata-se da “Mãe Armênia“, bem menos sorridente e com apenas uma espada nas mãos, sem o vinho.
A razão de tamanha seriedade pode ser explicada na história do país, o primeiro do mundo a adotar o Cristianismo como religião oficial, ainda no ano 301. A crença foi uma das razões pela qual se tornaram vítimas de um dos maiores massacres da humanidade: o Genocídio Armênio. Uma ação sistemática de extermínio comandada pelo Império Otomano (atual Turquia) entre 1915 a 1923, resultando na morte de aproximadamente 1,5 milhão de armênios.
O conflito causou uma verdadeira diáspora de população, gerando uma grande comunidade de descendentes ao redor do mundo (a socialite Kim Kardashian e os membros da banda System of a Down são alguns deles). A Turquia até hoje não assumiu a responsabilidade, um impasse diplomático que perdura entre os dois países e mantém as fronteiras fechadas. Há também uma grande rivalidade pela área fronteiriça ao redor do Monte Ararat, onde especula-se que teria aportado a Arca de Noé, narrada na Bíblia.
Devido a uma disputa territorial com o Azerbaijão, a fronteira com o país vizinho também é fechada, transformando a Armênia na única nação do mundo a ter duas fronteiras bloqueadas! Embora não seja possível entrar na Armênia via Turquia ou Azerbaijão, as fronteiras com a Geórgia e Irã seguem abertas.
A lembrança do trágico evento é constante e transformou o Memorial do Genocídio Armênio (Tzitzernakaberd) na principal atração da capital Yerevan. O monumento é aberto a visitação o ano todo, e costuma lotar no dia 24 de abril, data que marca o início do massacre. Ao contrário do que possa se pensar, o ambiente não transmite tristeza, mas sim paz e esperança, com a presença de uma chama eterna simbolizando a continuidade do povo. Muitos visitantes depositam flores em homenagem às vítimas e é permitido fotografar, desde que de maneira respeitosa.
Fora dali, a capital é vibrante. A gigante Praça da República é o ponto principal da cidade, rodeada de inúmeros cafés – uma paixão nacional -, onde se reúnem boa parte dos jovens que ainda não deixaram o país em busca de melhores oportunidades de trabalho.
Embora seja um país seguro e urbanizado, a Armênia ainda é um país pobre e com salários bem abaixo da média mundial. A falta de perspectivas faz com que a população mais jovem escolha imigrar para outros destinos na Europa. Estivemos por lá no dia em que o Primeiro-Ministro cedeu à pressão popular e renunciou, o que levou uma multidão às ruas para celebrar a conquista e exaltar o “orgulho de ser armênio”.
Se por um lado Yerevan tinha milhares de manifestantes promovendo passeatas e buzinaços, nos arredores do centro da cidade (ou “Kentron“, como costumam chamar) o comércio funcionava normalmente. Ao redor as principais atrações são a Casa da Ópera, Praça da Liberdade e o Parque Lago dos Cisnes.
Por toda a cidade encontram-se bonitas igrejas, como a Catedral de São Gregório e outros templos apostólicos, formando a Igreja Nacional da Armênia. Dentre outras diferentes práticas, eles têm o seu próprio líder (ao invés do Papa) e celebram o Natal no dia 6 de janeiro.
O interior montanhoso possui bonitas paisagens rurais, quase sempre acompanhadas de neve e ovelhas. Mas o destaque vai para as centenas de monastérios espalhadas pelo país. Em especial o Khor Virap, a pouco mais de 40 km da capital. O lugar ficou conhecido por ter sido a prisão de São Gregório, o Iluminador, padroeiro da Armênia e responsável pela conversão da nação a fé cristã, antes mesmo de Roma. A maneira mais fácil de chegar é de táxi, quem se dispor a ir será presenteado com uma vista estonteante do Monte Ararat.
Mas não se deixe enganar pelos templos religiosos, a Armênia também pode ser o lugar certo para praticar o terrível pecado da gula. Começando pela basturma, uma tentação em forma de comida: carne seca temperada com alho, cominho e outros condimentos, proporcionando um sabor forte e marcante que combina com absolutamente tudo, desde simples omeletes e sanduíches a pratos mais refinados. O Cafe Basturma é o lugar ideal para prová-la.
Os restaurantes armênios em geral são ótimos, mas quem procura o melhor custo-benefício deve ir direto no Tavern Yerevan, frequentemente apontado como o melhor restaurante da cidade. É difícil acreditar, mas os melhores pratos do menu não custam mais que U$3 e são deliciosos. O Putuk é uma curiosa sopa de carne levada ao forno com uma capa crocante que lembra a casquinha dos empadões brasileiros. A Tolma é imperdível, com recheios de vegetais ou carnes embalados em folhas de uva. De sobremesa, a Gatah é o que de melhor a culinária armênia sabe fazer com ingredientes simples como manteiga e açúcar. O vinho também é a bebida nacional por aqui e marca presença nos cardápios, mas se puder experimente o Tan, “a segunda bebida nacional”, refrescante e feita a base de iogurte.
Embora tenham suas próprias iguarias, é interessante notar que Armênia e Geórgia já foram invadidas por diversas redes de fast food, sendo muito fácil encontrar comida italiana, árabe, grega e asiática literalmente em qualquer esquina.
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Melhor época para visitar
– “Você quer brincar na neve?” Rodeadas de montanhas, as capitais da Geórgia e Armênia absorvem a temperatura e podem deixar o clima em pólos extremos, dependendo da estação. No inverno os termômetros facilmente chegam a valores negativos, enquanto no verão o calor pode ser desagradável, com máximas de até 40ºC entre julho e agosto.
A melhor época para visitar tanto Tbilisi quanto Yerevan é na primavera (maio a junho) e no outono (setembro a outubro), quando o clima está perfeito, nem tão quente ou tão frio, permitindo passear com mais conforto pelas cidades.
Segurança
Os nomes “Geórgia” e “Armênia” podem despertar algum receio em quem acompanhou as notícias da década de 90, onde ambos os países lutavam por territórios remanescentes após a dissolução da União Soviética. Embora algumas disputas não tenham sido inteiramente resolvidas, o clima de instabilidade nos dias atuais é mais político do que bélico. Mesmo com as respectivas crises econômicas e altos índices de desemprego, Geórgia e Armênia não registram aumentos na criminalidade e são destinos considerados seguros, recomendando-se apenas as precauções básicas.
Desembarcamos em ambos os países durante momentos delicados. Na Armênia, o país estava de luto em memória aos 103 anos do genocídio (24 de abril), data que em 2018 coincidiu com a renúncia do primeiro-ministro do país, tranformando as ruas em palcos de grandes manifestações. Já na Geórgia, em maio, os jovens foram às ruas em protesto ao fechamento de casas noturnas e também exigiam a saída do premier.
Apesar das aglomerações e fechamento de vias, não vimos nenhum excesso por parte dos manifestantes, que mesmo insatisfeitos, mantiveram-se em seu direito democrático sem causar prejuízos ao bem público ou confrontos com a polícia.
Dicas da Geórgia e Armênia
– Não se restrinja somente as capitais. Visite os magníficos monastérios no interior da Armênia, bem como o belo litoral da Geórgia, especialmente a cidade de Batumi, banhada pelo Mar Negro.
– A falta de proficiência em inglês é um problema de ambos os países, mesmo entre os mais jovens. Espere por situações cômicas onde mímicas e dicionários online serão a melhor solução. O russo, no entanto, é praticamente a segunda língua. Se você souber o básico, conseguirá se virar bem.
– O passado soviético não é um tabu e pode ser discutido livremente – a herança cultural está em toda parte. Note, no entanto, que georgianos são mais progressistas e sonham em entrar para a União Europeia, enquanto armênios tendem a falar dos tempos da ex-URSS com certa nostalgia.
– Geórgia e Armênia estão entre os países com o maior número de fumantes no mundo e as leis antitabagistas ainda não pegaram. Quem tem problemas com a fumaça deve sempre ficar em espaços abertos e optar pelo lado externo dos restaurantes, por exemplo.
– O custo de vida é barato em ambos os países e se reflete nos preços baixos de hotéis e restaurantes. Entretanto, a Geórgia é ligeiramente mais cara que a Armênia, com custos em torno de 15-20% a mais do que o país vizinho.
– Tbilisi possui uma vida noturna bem agitada, recebendo diversos festivais de música europeus e com uma ampla disponibilidade de bares e baladas. Já Yerevan é mais pacata e combina com passeios sem pressa durante o dia.
– Apesar das diferenças culturais, georgianos e armênios possuem em comum a fé cristã e a paixão pelo vinho. Caso seja abstêmio, melhor repensar 🙂
E você, já visitou a Geórgia e a Armênia ou tem planos de viagem? Deixa seus dicas nos comentários!